sexta-feira, 27 de abril de 2012

Primeiro indígena a se tornar antropólogo pela Ufam incentiva a procura pela formação



Antes de completar um ano de idade, um menino indígena da etnia tukano foi benzido pelo kumu (benzedor) e recebeu o nome Yupuri. Isto aconteceu em 1980, na comunidade São Domingos Sávio, à margem do rio Tiquié, na região do Alto Rio Negro, no Amazonas, fronteira com a Colômbia. Ao mesmo tempo, o garoto também recebeu um nome de batismo “de branco”, João Rivelino Rezende Barreto.
Sua família havia passado alguns anos na Colômbia, trabalhando com outros parentes indígenas da mesma etnia e não-indígenas, mas retornou ao Brasil quando João Rivelino tinha alguns meses de vida.
Adolescente, ele saiu de sua comunidade junto com os pais e irmãos para viver, primeiramente, em uma outra aldeia, em São Gabriel da Cachoeira (sede do Alto Rio Negro), depois no município vizinho de Santa Isabel do Rio Negro. A intenção era iniciar um tratamento de saúde para sua mãe.
Ainda muito jovem, para ajudar a família, mas sobretudo para se sustentar, trabalhou como pescador, cipozeiro e garçom. Nunca deixou de estudar. Graduou-se em Filosofia, com formação em uma instituição superior das Missões Salesianas, da Igreja Católica.
No último dia 23 de março, Barreto tornou-se o primeiro indígena formado pelo Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), criado em 2007. Em sua dissertação, Barreto optou estudar o seu povo, o seu grupo e sua organização, que em seu trabalho foi nomeada pela categoria “coletivo”.
Carlos Dias, orientador de João Rivelino, descreveu o momento (a defesa da dissertação) como “um rito de passagem” que “iniciou” não apenas Barreto, mas o antropólogo britânico Stephen Hugh-Jones (foi a primeira vez que Hugh-Jones participou de uma banca no Brasil) e dele próprio, já que o indígena foi o seu primeiro orientando.
Nesta semana, João Rivelino Barreto falou sobre sua trajetória pessoal, profissional e cultural em entrevista dada ao jornal A Crítica, cujos trechos são publicados a seguir:

Faça um relato sobre a sua origem, seu nome e sua comunidade.
Pertenço ao grupo de nome Sararó Yuúpuri Búbera Pôra. Também somos conhecidos como família Barreto. Meu nome ocidental é mais utilizado, mas não reduz meu nome tradicional. O meu nome de benzimento nunca vai deixar de existir. Esses nomes são importantes porque trazem benefício para as pessoas. Meu filho também foi benzido. As pessoas que são filhas de branco e índio também querem receber esse nome porque ele traz benefício para a alma e para o coração.
Onde você nasceu?
No tempo da borracha, nos anos 60, meus pais foram para a Colômbia. Eles trabalharam para os brancos como seringueiros, embora também vivessem com parentes tukano que são da Colômbia. Mas no mesmo ano em que nasci, voltamos para o Brasil. A gente se identifica como tukano brasileiro, embora isto não impeça que visitemos nossos parente da Colômbia. Eles também nos visitam.
Em que contexto se deu o deslocamento da sua família para outras áreas?
Morei em São Domingos Sávio até os sete anos de idade. Devido à enfermidade da nossa mãe tivemos que ir para São Gabriel da Cachoeira. Moramos na antiga Casa do Índio, depois fomos para uma outra comunidade, onde nossa irmã se mudou quando casou com um índio tariano. Mas nunca perdemos contato com São Domingos. Nessa ida e vinda nossa mãe faleceu. Passamos a ser andarilhos. Trabalhamos no garimpo, na fronteira do Brasil com a Colômbia, descoberto por meus primos. Depois, fomos morar em Santa Isabel do Rio Negro.
Foi ali que você teve a percepção do que queria?
Eu sempre quis estudar. Foi isso que mais marcou a minha vida. Eu tinha 14 anos quando cheguei em Santa Isabel. Mas foi difícil. Ao mesmo tempo eu levava vida de garimpeiro, de pescador. Fiz muitas coisas. Mas foi ali que começou a transformação. A gente morava numa ilha em frente à cidade. Íamos de canoa para a escola, debaixo de sol e chuva. Meu pai foi trabalhar na vacaria dos padres salesianos e depois fui eu que passei a trabalhar lá.
Como você fazia para trabalhar e estudar ao mesmo tempo?
Foi uma época de muita dificuldade, de não ter o que comer. Eu sempre ia para a escola contando com a sopa que a irmã (freira) ia servir. E também a merenda dos padres. Depois, conhecemos uma família que nos ajudou, a da dona Sandra Gomes Castro. Meu pai retornava muito para a comunidade e ela recolheu eu e meu irmão. Foi nessa época que eu comecei a trabalhar como garçom em uma banca na praça. Nos primeiros meses morei naquela barraquinha. Eu trabalhava a troco de cama, roupa e comida e para poder estudar.
Como foi sua aproximação com os padres salesianos?
Eu tocava violão na igreja. Não é que gostasse muito de rezar, mas eu gostava de violão. Comecei a participar do encontro vocacional com os salesianos. Não tínhamos muitas opções de vida até o temoo em que eu estava lá. Hoje tem a UEA, tem a Ufam. Quando eu terminei o terceiro ano ou ia ser gari, ou entraria no Exército ou entrava no seminário. Escolhi o terceiro. Passei seis anos com os salesianos. Vivi esse período de formação toda. Graças a eles consegui fazer uma faculdade, ter formação humana e intelectual.
Como era a relação entre a formação que você recebia na época com a sua história de vida?
Toda essa formação me deixava inquieto em relação à minha cultura. Eu nunca morei longo tempo na minha comunidade. Sempre estava andando de um lugar para outro. Viajei bastante, conheci o Brasil. Mas minha família estava em situação difícil. Com o tempo pensei em deixar a vida religiosa.
Onde você estudou?
Em 2003 vim para Manaus, onde iniciei como aspirante. Morei no Colégio Salesiano Dom Bosco, na Zona Leste. Depois fiz o primeiro ano da faculdade aqui em Manaus, em 2004. Em 2005 fiz noviciado em Mato Grosso do Sul. Em 2006, me encaminharam para Recife para o segundo ano. Nos anos seguintes terminei em Manaus.
O que você pesquisou em seu projeto de conclusão de curso?
Fiz uma monografia na graduação pensando no meu grupo indígena. Mas não tive espaço para discutir sobre os conhecimentos tukano. Meu orientador disse que eu falaria sobre o homem na Grécia Antiga, na Idade Moderna, o homem segundo Platão e segundo Kant. E o homem segundo o tukano teve um espaço muito reduzido. Mas isso não me desmotivou.
Como foi seu ingresso no Mestrado em Antropologia da Ufam?
Entrei no processo seletivo quando não havia cota. Estudei bastante. Tinha receio de não passar.
Você já sofreu preconceito no meio acadêmico?
Quando você fala em preconceito, sinto isso dentro de mim. Eu tenho uma boa formação, mas não tive ainda sorte em termos de emprego. Muitas vezes as pessoas impõem uma certa barreira em termos profissionais. Eu já coloquei muitos currículos em escolas particulares, mas ainda não tive sucesso. Por enquanto, eu presto serviço no curso do Pró-Índio, da UEA. Mas gostaria de trabalhar como professor e pesquisador.
Você pretende voltar para a sua comunidade? Voltar a ter uma relação com ela?
O retorno é muito significativo para nós enquanto homens indígenas, enquanto tukano, enquanto pertencente a uma etnia, a uma cultura diferenciada. Estou com projeto de retorno sim, sempre falo com meu pai. Eu e meu irmão queremos reestruturar a caça e o roçado. O retorno está sempre voltado para os valores culturais, os nossos conhecimentos, nossos benzimentos, da forma de a gente se organizar.
Como foi realizar pesquisa em sua própria comunidade?
Retornei para São Domingos quando fui fazer pesquisa de campo em junho de 2010. Pesquisar seu próprio grupo foi fácil e ao mesmo tempo difícil. Fácil porque você fala com sua língua, entende, mas a transcrição é mais difícil. É desafiante.
Como pesquisador, como foi trabalhar sem o distanciamento ou estranhamento, já que se tratava de sua própria comunidade?
A minha pesquisa tinha a proposta de trazer para o conhecimento acadêmico as noções que os tukano têm sobre eles mesmos. Claro que os antropólogos usam seus termos científicos para descrever as unidades sociais. Mas quando cheguei como pesquisador, eles (os parentes indígenas) já me colocaram como diferencial. Eles falavam “olha, nosso sobrinho está chegando aí, ele é estudante de antropologia”. Já nos colocam em nível superior. Mas eu não queria essa forma de tratamento.
Como você se sente estudando seu próprio povo?
O Alto Rio Negro é um palco muito bem estudado. Mas a gente vê que muitos textos são de gringos. É uma antropologia feita da forma deles. No meu caso, é mais concreta, prática, do que são as unidades sociais. Eles (os outros antropólogos) descrevem com teorias científicas, usam termos como “tribo”, “grupos exogâmicos”. Mas eu usei termo “coletivo” no lugar de clã, sib, tribo. Quando se trata de grupo se limita a um determinado local. Pode ser grupo na Colômbia, em São Domingos, em Manaus.. Mas todos eles se identificam como pertencente ao Sararó Yuúpuri Búbera Pôra. A idéia de coletivo é extensa, ultrapassa as fronteiras.
O que você acha de muitos indígenas estarem fazendo faculdade, como é o caso dos alunos do mestrado em Antropologia da Ufam?
O fato de os indígenas cursarem faculdade é uma grande conquista. Mas eu ficava em dúvida se ao entrar na faculdade iria me formar com as teorias dos brancos. É importante ver os valores das nossas culturas. Me formei em um contexto acadêmico pensando nos próprios conhecimentos do meu povo.
Sobre o que trata sua dissertação?
O tema é “Formação e Transformação dos Coletivos Indígenas no Noroeste Amazônico – do Mito à sociologia das Comunidades”. Eu faço uma etnologia em cima do meu próprio grupo. Como eles pensam, o que descrevem, como aconteceu a formação, como chegaram até lá. O primeiro capítulo traz uma descrição mais mitológica. São duas noções que eu considerei como teoria tukano. São noções tukano, o Uükûse e o Muropau Uúsetise (Nota da Reportagem: a grafia é aproximada da pronúncia). A primeira é a arte do diálogo, ela descreve as narrações míticas de formação da terra, da água, dos homens que fizeram a viagem na canoa em transformação, as unidades sociais e as hierarquias. O segundo é um discurso sociológico.
Como foi a relação com seu orientador?
Encontrei com o Carlão (Carlos Dias) no corredor, conversei e ele topou me orientar. Passamos a organizar todo o processo de orientação. O Carlão me ajudou muito, embora todos os professores do mestrado sejam de ponta e se dedicam. Mas ele, enquanto etnólogo, inspirava-se em meu trabalho também e me via como uma pessoa que tinha que entender. Não era apenas meu orientador. O mais desafiante foi ele me fazer pensar enquanto tukano. Ele me deu pistas, fazer leitura antropóloga tukana e fazendo antropologia.
Qual a contribuição de seu trabalho?
Produzi uma genealogia, um mapa. Isso traz um diferencial muito grande. Além de ser um pensamento, está buscando um diálogo com a antropologia. Não podemos isolar nossos conhecimentos, temos que dialogar com a antropologia. A Antropologia da Ufam está possibilitando eu falar de nossos conhecimentos, mas ao mesmo tempo estar ouvindo.
QUEM É
João Rivelino Barreto, de nome indígena Yupuri dado pelo kumu, tem 31 anos. Ele pertence à etnia tukano e é membro do grupo Sararó Yuúpuri Búbera Pôra, que não tem uma tradução literal para o português, da comunidade São Domingos Sávio, localizada à margem do rio Tiquié, na região do Alto Rio Negro. Barreto tem formação em Filosofia em instituições de nível superior da Congregação Católica Salesiana. Concluiu Mestrado em Antropologia pela Ufam, tornando-se o primeiro indígena a se formar neste programa.

FONTE: A crítica .com

Com 10 votos a 0, STF aprova cotas raciais em universidades



O STF retomou o julgamento das cotas raciais na UnB nesta quinta-feiraFoto: Foto: Nelson Jr./SCO/STF/Divulgação

Direto de Brasília
Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consideraram constitucional o sistema de cotas raciais para ingresso de alunos afrodescendentes em universidades públicas. A votação, que terminou com 10 votos favoráveis e nenhum contrário, foi encerrada por volta das 20h10 desta quinta-feira com pronunciamento do presidente da Corte, Ayres Britto. "O Brasil tem mais um motivo para se olhar no espelho da história e não corar de vergonha", disse o ministro ao proclamar o resultado.
O julgamento teve início na quarta-feira quando Ricardo Lewandowski, relator da ação do DEM contra o sistema de reserva de vagas da Universidade de Brasília (UnB), rejeitou o pedido do partido político e reconheceu a constitucionalidade do ingresso. O sistema da UnB prevê a destinação de 20% das vagas do vestibular a candidatos autodeclarados negros ou pardos. A universidade defendia que isso soluciona uma desigualdade histórica. O DEM, por sua vez, afirmava que o sistema fere o princípio da igualdade e ofende dispositivos que estabelecem o direito universal à educação.
Por volta das 19h, o ministro Celso de Mello deu início a sua fala, favorável ao modelo adotado desde 2004 pela Universidade de Brasília (UnB). Antes dele, Marco Aurélio considerou constitucional as cotas. Gilmar Mendes deu o sétimo voto favorável, mas disse que é necessária a revisão do modelo de cotas com uma ressalva ao voto do relator Ricardo Lewandowski.
O ministro Luiz Fux foi o primeiro a se pronunciar nesta quinta-feira. Elogiando o voto do relator feito ontem, Fux definiu que ações afirmativas ainda são necessárias em um País com desigualdades sociais tão grandes como o Brasil. "A opressão racial dos anos da sociedade escravocrata brasileira deixou cicatrizes que se refletem no campo da escolaridade. A injustiça do sistema é absolutamente intolerável", disse.
Confusão
Quase ao final de seu voto, o ministro Fux foi interrompido por um índio que protestava dentro do plenário pela inclusão da etnia nas discussões sobre o sistema de cotas. Identificado como Araju Sepeti, o índio guarani de Mato Grosso chamou os ministro de racistas e urubus e foi retirado pelos seguranças da Corte.
Após a retomada da sessão, Fux disse que "a ansiedade é o mal da humanidade" e então citou o direito dos indígenas, conforme tinha pedido o índio retirado do plenário.
A ministra Rosa Weber, por sua vez, afirmou que não se pode dizer que os brancos em piores condições financeiras têm as mesmas dificuldades dos negros, porque nas esferas mais almejadas das sociedades a proporção de brancos é maior que de negros.
"A representatividade, na pirâmide social, não está equilibrada. Se os negros não chegam à universidade, por óbvio não compartilham com igualdade de condições das mesmas chances dos brancos. Se a quantidade de brancos e negros fosse equilibrada, seria plausível dizer que o fator cor é desimportante. A mim não parece razoável reduzir a desigualdade social brasileira ao critério econômico", disse a ministra.
Já na opinião da ministra Cármen Lúcia, que votou em seguida também a favor das cotas raciais, as ações afirmativas não são as melhores opções. "A melhor opção é ter uma sociedade na qual todo mundo seja livre para ser o que quiser. Isso é uma etapa, um processo, uma necessidade em uma sociedade onde isso não aconteceu naturalmente", disse Cármen Lúcia.
Discriminação enraizada
Após um intervalo de quase 40 minutos, Joaquim Barbosa, o único ministro negro da Corte Suprema, fez um voto que não chegou a 10 minutos. Barbosa acusou que a discriminação está tão enraizada na sociedade brasileira que as pessoas nem percebem.
"Aos esforços de uns em prol da concretização da igualdade que contraponham os interesses de outros na manutenção do status quo, é natural que as ações afirmativas sofram o influxo dessas forças contrapostas e atraiam resistência da parte daqueles que historicamente se beneficiam da discriminação de que são vítimas os grupos minoritários. Ações afirmativas têm como objetivo neutralizar os efeitos perversos da discriminação racial", disse Barbosa em seu voto.
O voto decisivo foi dado pelo ex-presidente da Corte, ministro Cezar Peluso. Interrompido por apartes dos ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, Peluso resumiu a questão ao afirmar que as cotas são necessárias à sociedade brasileira no atual momento, mas que devem ser analisada no futuro para verificar se ainda atingem o objetivo de inserir afrodescendentes em posições de mais destaque.
"Não posso deixar de concordar com o relator que a ideia é adequada, necessária, tem peso suficiente para justificar as restrições que traz a certos direitos de outras etnias. Mas é um experimento que o Estado brasileiro está fazendo e que pode ser controlado e aperfeiçoado", votou o ministro.
Tribunal racial
O ministro Gilmar Mendes criticou o fato de as políticas de cotas da UnB adotarem exclusivamente o critério racial. Ele afirmou que a política pode ser aperfeiçoada e citou o exemplo do Prouni, programa de bolsas de estudo do governo federal, que, além da raça, leva em conta critérios sociais.
"A ideia de tribunal racial evoca a memória de coisas estranhas. Não é um modelo. Seria mais razoável adotar-se um critério objetivo de referência de índole sócio-econômica. Todos podemos imaginar as distorções eventualmente involuntárias e eventuais de caráter voluntário a partir desse tribunal que opera com quase nenhuma transparência. Se conferiu a um grupo de iluminados esse poder que ninguém quer ter de dizer quem é branco e quem é negro em uma sociedade altamente miscigenada", disse o ministro, lembrando do caso envolvendo dois gêmeos univitelinos, em que um entrou na UnB pelo sistema de cotas e o outro foi rejeitado.
Oitavo ministro a votar, Marco Aurélio Mello seguiu o mesmo raciocínio externado pelos ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Para ele, o sistema de cotas é essencial, desde que as políticas sejam temporárias. E é válida, principalmente, pelo que classificou como "neutralidade do Estado" em favor dos afrodescendentes.
"A neutralidade estatal mostrou-se nesses anos um grande fracasso. É necessário fomentar-se acesso à educação. Urge implementar programas voltados aos menos favorecidos", disse Marco Aurélio. O ministro Celso de Mello, decano da Corte, citou, em seu voto, convenções internacionais que estabelecem formas de se combater o preconceito e garantir condições de igualdade.
"As ações afirmativas são instrumentos compensatórios para concretizar o direito da pessoa de ter sua igualdade protegida contra práticas de discriminação étnico-racial. Uma sociedade que tolera práticas discriminatórias não pode qualificar-se como democrática", afirmou em seu voto.
O presidente do STF, ministro Ayres Britto, foi o último a votar. Também favorável ao sistema de cotas, Britto afirmou que os erros de uma geração podem ser revistos pela geração seguinte e é isto que está sendo feito.
"Aquele que sofre preconceito racial internaliza a ideia, inconscientemente, de que a sociedade o vê como desigual por baixo. E o preconceito, quando se generaliza e persiste no tempo, como é o caso do Brasil, por diversos séculos, vai fazer parte das relações sociais de bases que definem o caráter de uma sociedade", disse Ayres Britto.
STF julga ações sobre cotas e Prouni
Além das cotas raciais na UnB, o STF vai analisar duas ações que contestam a constitucionalidade da reserva de vagas por meio de cotas sociais e o perfil do estudante apto a receber bolsas do Prouni. A outra ação sobre cotas que aguarda julgamento foi ajuizada pelo estudante Giovane Pasqualito Fialho, reprovado no vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para o curso de administração, embora tivesse alcançado pontuação superior à de outros candidatos. Os concorrentes que tiveram nota menor foram admitidos pelo sistema de reserva de vagas para alunos egressos das escolas públicas e negros.
Em relação ao Prouni, implementado a partir de 2005 com a concessão de bolsas de estudo em universidades privadas, a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenem) alega que a medida provisória que originou o programa não atende ao princípio constitucional da isonomia entre os cidadãos brasileiros.

FONTE: Site Terra


Jovens negros acompanharam votação sobre sistema de cotas raciais de universidades em frente ao STF





Um grupo de jovens negros acompanhou o julgamento da ação de inconstitucionalidade do sistema de cotas raciais de universidades em frente à entrada do STF (Supremo Tribunal Federal). A Corte disponibilizou dois telões para que os manifestantes pudessem assistir à votação. Sentado na rampa de acesso ao STF, o grupo repudiava a fala dos advogados contrários ao sistema de cotas e aplaudia entusiasmado os discursos dos favoráveis.
Emocionada, a estudante Márcia Morais contou que está confiante em relação ao resultado do julgamento. “Quero que as universidades enegreçam”, disse. Márcia foi cotista da Universidade do Rio Grande do Sul e conta que foi coagida por um professor e questionada sobre sua capacidade intelectual de estar entre os universitários.
A estudante, que mora em Rennes, na França, e defende duas teses de mestrado, organizou a Primeira Semana da Consciência Negra da Universidade Sciences Po. “ Lá, eu sempre falei muito sobre políticas de afirmação e eles me questionavam porque eu não tinha voltado para Brasil. Então, comecei a mandar e-mails para professores aqui no Brasil. Acabei coordenando a semana, com todo o suporte da Sciences Po”.Márcia Morais conta que ficou decepcionada com a atitude do professor e da universidade diante da situação. “À época, eu estava para fazer um intercâmbio na Universidade Sciences Po, na França, e eu decidi que nunca mais colocaria meus pés em uma universidade brasileira como aluna”. “Uma das minhas amigas me ligou e disse que tinha muita vergonha de ser gaúcha e do que estava acontecendo na universidade. Na época [em 2006], picharam na universidade 'voltem pra senzala' e ela dizia que não se sentia representada pela faculdade”, relatou Márcia.
“Quantos negros você vai encontrar como eu, que, antes de entrar na faculdade, já falava duas línguas, que teve acesso a uma escola marista? Quero as universidades cheias de negros, para que um dia qualquer um possa estudar e não passe o que eu passei.”
Um dos coordenadores do movimento negro no Brasil, frei Davi, também acompanhou a votação ansioso. “Sinto que esse é um processo já pacificado. Os ministros estão suficientemente informados sobre o assunto, devemos ganhar por 9 votos a 2”, previu. “O Brasil só vai ser um país fantástico quando os negros tiverem direitos iguais, quando eles estiverem inseridos dignamente na sociedade, como senadores, deputados, ministros, advogados”.

FONTE: Uol Educação

terça-feira, 24 de abril de 2012

Um pouco dos Fulni-ô




Índios Fulni-ô



Lúcia Gaspar
Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco

Os índios da tribo Fulni-ô vivem no município de Águas Belas, em Pernambuco numa aldeia de 11.500 hectares, localizada a 500 metros da sede da cidade. Sua população é de aproximadamente 3.600 índios.
 Eram conhecidos, antigamente, como Carijó ou Carnijó e não se conhece o tempo da sua existência.
 A origem do nome Fulni-ô é muito antiga. Significa "povo da beira do rio" e está relacionada com o rio Fulni-ô que corre ao longo da aldeia de Águas Belas.
 Os índios têm convívio diário com os não-índios, são todos bilíngües, se vestem como os brancos, mas não perderam sua identidade. São os únicos indígenas do Nordeste brasileiro que mantêm viva a sua língua nativa a Yaathe (ou Yathê).
 A língua Yaathe, que significa "nossa boca, nossa fala, nossa língua" é oral, não possui cartilha. É aprendida pelos índios em casa com os familiares, no convívio doméstico e, segundo a professora Alieta Rosa, por intermédio de uma escola bilíngue que a aldeia possui*. Inclusive, existe um livro com o registro gramatical da língua.
Além da aldeia a comunidade possui na reserva um outro local de moradia, onde habitam durante três meses por ano por ocasião dos rituais do Ouricuri.
 Ouricuri é um retiro religioso secreto, realizado anualmente nos meses de setembro, outubro e novembro, onde não é permitida a entrada de não-índios (mesmos os que têm qualquer tipo de parentesco com os Fulni-ô), pois é um espaço sagrado para eles. Durante esse período os indígenas se mudam para a outra aldeia, também chamada Ouricuri, distante cerca de cinco quilômetros do local onde habitam, levando quase tudo que têm, até os bichos de criação.
 O que ocorre no Ouricuri é um mistério. Nem mesmo as crianças revelam o que se passa no evento. Sabe-se que durante esse período os homens dormem em local reservado, o Juazeiro Sagrado, ao qual as mulheres não podem ter acesso. As rivalidades são esquecidas. As relações sexuais e a ingestão de bebidas alcóolicas são rigorosamente proibidas.
 Até os anos trinta, as casas dos Fulni-ô eram construídas, exclusivamente, com a palha do ouricuri (planta da família das palmeiras). Hoje, a aldeia é composta por habitações individuais de taipa ou alvenaria, semelhantes às das populações pobres do Nordeste brasileiro.
 Os índios vivem do artesanato da palha do ouricuri, comercializado nas feiras livres da região, da agricultura de subsistência e de alguma criação de bovinos e suínos. Ainda praticam a caça e a pesca, mas essas atividades estão quase em extinção, devido aos desmatamentos e à poluição dos rios da região.
 Suas manifestações culturais incluem a dança e a música. As danças dos Fulni-ô são inspiradas em vários animais e aves, sendo o toré a mais tradicional. Existem também a cafurna, uma dança cultural resultante da influência de outros grupos e uma conhecida como coco de roda, dançada com estilo próprio e que tem origem na cultura dos negros. As músicas das danças são cantadas em português e yaathe.
 Usam como instrumentos musicais, o maracá, o toré e a flauta. Tocam também instrumentos dos brancos como clarinete, pistom, trombone, violão, guitarra. Possuem até conjuntos e bandas formadas.

Os Fulni-ô utilizam para curar doenças muitas plantas que sobreviveram ao desmatamento. Possuem um Centro Fitoterápico de Reprodução de Mudas e Essências Medicinais, mantido com o apoio da Fundação Nacional da Saúde e da Unesco, onde são cultivadas várias plantas que servem comoremédios populares distribuídos na aldeia.
 Como ornamentos e decoração são produzidos machados de pedra, bordunas, arcos e flechas.
 O uso do cocar, pintura corporal ou adereços não são marcas dos Fulni-ô. Para eles a origem do índio é a sua linguagem, por isso conseguiram mantê-la viva até hoje.

Recife, 19 de agosto de 2003.
(Atualizado em 28 de agosto de 2009).
FONTES CONSULTADAS:
* Informações enviadas pela professora Aliete Rosa por e-mail, para a coordenação do projeto Pesquisa Escolar on-line, em 11 setembro de 2007.
CAVALCANTE, Simone. Ouricuri: o mistério Fulni-ô. Brasil Indígena, Brasília, D.F., a . 2, n.11, p.18-19, jul./ago. 2002.
AS COMUNIDADES indígenas de Pernambuco. Recife: Instituto de Desenvolvimento de Pernambuco-Condepe, 1981.
SÁ, Marilena Araújo de. "Yaathe" é a resistência dos Fulni-ô. Revista do Conselho Estadual de Cultura, Recife, Ed. especial, p.48-54, 2002.

COMO CITAR ESTE TEXTO:

Fonte: GASPAR, Lúcia. Índios Fulni-ô. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acesso em: dia  mês ano. Ex: 6 ago. 2009.

Escolas de Mesquita celebram a Semana dos Povos Indígenas

Prevista na Agenda Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, a semana que transcorreu dia 16 à 20 de abril, as escolas municipais celebraram os povos indígenas, sua cultura, sua história e atualidade. Entre as atividades tivemos contação de história, exposição de artes plásticas, pesquisas, exibição de imagens e leitura de histórias que valorizam a cultura indígena, em especial os livros de Daniel Munduruku.
No Cemei Cecília Meireles, os alunos tiveram a oportunidade de fazer um delicioso bolo de aipim com mães de alunos da unidade, resgatando o momento de aprendizagem que mães indígenas proporcionavam aos seus curumins.
No Cemei Paulo Freire, além de tudo que foi estudado e trabalhado com os pequenos, a escola recebeu a visita dos índios Fulni-ô, que contaram sua história, seus hábitos e como vivem hoje. Houve também pintura corporal das crianças e apresentação de dança. Um momento único para as famílias que puderam participar de todo o evento e ver os trabalhos feitos pelos alunos.
Na E. M. Maria Dolores de Mello Porto, a dinamizadora do Clube de Leitura, prof. Lílian, com a ajuda de um data-show, exibiu um slide com diversas fotos e usou os livros de Munduruku para aproximar os pequenos da realizade de algumas aldeias.
E para auxiliar os professores no trabalho com a temática indígena, entendendo que esta "deve ser uma prática para o ano inteiro e que o debate e a importância deles não se esgota em lendas, bonecos de argila ou crianças pintadas", em que é preciso pesquisar com nossos educandos em todas as áreas do conhecimento, a contribuição desses povos de forma não estereotipada, revelando e reforçando atitudes discriminatórias, nós do Setor de Diversidade Étnico-Racial, da Semed Mesquita, organizamos um material com para ajudar os docentes, além de provocar as discussões e outras pesquisas, em que nossos alunos tenham a dimensão da diversidade da cultura indígena dos tempos dos Sambaquis até hoje (não, eles não foram sumiram!).


No combate a essa discriminação e valorizando o respeito às diversas culturas que nos constitui, e para que a gente não cante como outrora cantou Baby Consuelo o índio no passado. Que cantemos, em todas as nossas escolas que "todo dia, é dia de índio", e que índio não quer apito, índio quer respeito em sua diversidade!
Abaixo, seguem fotos de algumas escolas:
 





quinta-feira, 19 de abril de 2012

Entrevista: Índia We’e’ena Miguel

Neste dia do índio em que reforçamos a importãncia de ter nas escolas a imagens de índios conteporâneos, o msn mulher, entrevistou a índia, de etnia Tikuna We’e’ena Miguel, protagonista na luta pelos direitos das mulheres indígenas.

Índia We’e’ena Miguel: luta pelos direitos das mulheres indígenas

Ela tem 24 anos, estuda gestão financeira, é artista plástica e presidente nacional das mulheres indígenas pela LIBRA. Neste Dia do Índio, conheça a história dessa guerreira que luta pelo direito das mulheres indígenas do Brasil.

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação
Por KARINA COSTA

O Tempo de Mulher é um espaço democrático que busca conhecer e discutir os dilemas, desejos e necessidades da mulher brasileira. Com a mulher indígena não seria diferente. Nesse 19 de abril, em que comemoramos o Dia do Índio, entrevistamos We’e’ena Miguel. Da Aldeia Tikuna de Umariaçu, município de Tabatinga no estado do Amazonas, de onde saiu há 12 anos, essa representante das mulheres indígenas cursou artes plásticas e estuda atualmente gestão financeira, tudo, segundo ela, em prol de seu povo.
Com o reconhecimento de seu trabalho artístico – ela se aprimorou no método acrílico sobre tela -, recebeu vários prêmios e convites para exposição de suas obras. A índia tikuna aproveitou o sucesso e a visibilidade, e decidiu dedicar-se à inclusão social dos povos indígenas por meio da difusão da arte. Não à toa We’e’ena foi eleita a representante indígena da LIBRA – Liga das Mulheres Eleitoras do Brasil.
Hoje, com 24 anos, reside em São Paulo e é casada com o violonista Maestro Robson Miguel, também conhecido como Cacique Cafuzo Tukumbó Dyeguaká. Eles residem em um castelo (isso mesmo!) no município de Ribeirão Pires, construído pelo Cacique, com o objetivo de contar a história de seus ancentrais índios e negros.
Nas próximas páginas, conheça um pouco da história da Índia Tikuna e seus objetivos como presidente Nacional das Mulheres Indígenas pela LIBRA.
  Foto: Divulgação

- Fale um pouco de sua origem e de sua transferência da aldeia para a cidade:
We’e’ena: Eu sou do povo Tikuna, Alto Solimões, interior do Estado do Amazonas. Vivem lá 35 mil Tikunas. Para chegar até minha aldeia leva-se 8 dias de barco – de Manaus até Tabatinga, que já é fronteira de Peru com a Colômbia. Eu me transferi da aldeia para a cidade aos 12 anos de idade para aprender a ler e a escrever. Me mudei com meus pais para Manaus, onde me formei no Ensino Médio. Nesse meio tempo, participei de um concurso e fui selecionada entre 45 alunos para receber uma bolsa de estudos para um curso de Artes Plásticas. Estudei durante quatro anos, me aperfeiçoei na técnica acrílica sobre tela e, ao mesmo tempo, nunca deixei de trabalhar com o movimento indígena e nem perdi a tradição de minha cultura e língua. Aliás, minha mãe nunca deixou que perdessemos nossas raízes, apesar de residir na cidade. Mas sempre tivemos essa ligação entre aldeia e cidade versus cidade e aldeia, estamos sempre indo e voltando.

- E como foi sua transferência para São Paulo? Como ficou conhecida pela luta em prol dos povos indígenas?
We’e’ena: Quando completei 18 anos, me transferi para São Paulo, onde terminei meus estudos e entrei para a faculdade, faço hoje o curso de Gestão Financeira. Não sabia que tinha tantos outros indígenas que moravam em São Paulo e lideravam movimentos, assim como era comum em Manaus. Fui me integrando aos índios Guarani, Chavante e outras etnias, e nossa união ocasionou o fortalecimento do movimento pelo nosso povo. Então em 2010, fui convidada a conceder uma entrevista em uma TV local para falar da mulher indígena. Uma das representantes da LIBRA - Liga das Mulheres Eleitoras do Brasil -, me conheceu nessa gravação e me fez o convite para integrar a instituição a fim de representar as mulheres brasileiras indígenas.
We'e'na e suas obras de arte. Foto: Divulgação

- E o que exatamente é a LIBRA e qual seu papel nessa instituição?
We’e’ena: A Liga das Mulheres Eleitoras do Brasil nasceu na Alemanha no século 20, e se extendeu entre Europa e EUA, quando no pós-guerra as mulheres se uniram para conseguir melhores condições de trabalho e direitos também de votar. A data da fundação do movimento foi acertada em 1975, onde também se deu o Dia Internacional da Mulher. No Brasil, a LIBRA existe há mais de 60 anos.
Aqui a instituição já tinha sua representante branca, não indígena, e também a afro, exceto uma mulher que pudesse falar e representar as indígenas. Depois que me viram dando entrevista para a TV, entraram em contato comigo e fizeram o convite a fim de fortalecer o movimento. Depois de três meses de conversa eu aceitei, pois não é fácil você representar uma nação indígena. Pois não sou somente porta voz das mulheres, mas de todo o povo indígena que ainda está lutando para ser reconhecido em sua própria terra.

- E desde quando você é representante pela LIBRA?
We’e’ena: Estou há dois anos nesse cargo. Faço palestras, falo de nosso povo para as indígenas e não indígenas. Realizo fóruns, debates em vários eventos pelo país a fim de conquistar e ocupar de fato nosso espaço, direitos sociais, artísticos, políticos e dar poder e visibilidade para as mulheres indígenas. Nós não temos visibilidade ainda, agora que estamos conseguindo entrando no Congresso Nacional, reivindicando leis. Aliás, reconhecemos que há muitos projetos escritos em nosso favor, e eu procuro entender as propostas para levar ao conhecimento das mulheres, já que sou representante das indígenas em nível nacional.
We'e'na com Ana Paula Padrão em premiação em São Paulo. Foto: Divulgação

- E como representante pela LIBRA, o que visa para seu povo? Qual tipo de reconhecimento almeja?
We’e’ena: Quero que a mulher indígena tenha direito a voz entre as aldeias e fora das aldeias. Que ela possa entra no mercado de trabalho, competir de forma igualitária e ter os mesmo direitos que o branco ou o negro. Não queremos ser diminuídos e discriminados porque as pessoas não conhecem a cultura indígena, mas reconhecidos, queremos ocupar os espaços sociais, administrativos em uma empresa, por exemplo, ter visibilidade artística, política. O que as mulheres indígenas querem é poder se unir e ter o mesmo direito de todas as pessoas.
Sou artista plástica e cantora, luto pelo meu espaço e então gostaria que todas as mulheres brasileiras indígenas tivessem também a oportunidade de mostrar seus trabalhos. Não vejo democracia quanto a isso. Quando falamos de Direitos Humanos temos que incluir o branco, o negro e o índio. O índio também vota, então tem o direito e o poder de conquistar o espaço de forma igualitária.

- Você saiu da aldeia aos 12, aos 18 já estava em São Paulo e hoje é representante das indígenas pela LIBRA. Qual sua ligação com as aldeias, para você representá-las, como busca esse vínculo? 
We’e’ena: Viajo por diversas partes do Brasil. Dias atrás, por exemplo, aproveitei que fui participar de um congresso na Bahia e visitei as indígenas Pataxó de lá. E agora com a tecnologia, fica mais fácil. É tudo muito novo, mas as mulheres estão interessadas nessa evolução, tentamos nos integrar pelas redes e criar uma maneira de não somente eu representá-las, mas que cada etnia possa ter sua representante. Eu visito as aldeias e tenho pedido que elejam uma mulher para que os represente e com quem eu possa ficar em contato para que me passe o que vem acontecendo, suas necessidades. Com esse conhecimento, tenho condição de levar propostas para nossos representantes no Congresso Nacional, por exemplo.
Em 2011, por exemplo, fizemos um fórum em São Paulo e conseguimos reunir 200 mulheres indígenas de todo o Brasil, pelo menos uma mulher de cada etnia.
Foto: Divulgação

- E como líder de um movimento a favor das indígenas, como avalia o processo de reconhecimento do povo indígena fora das aldeias?
We’e’ena: Hoje muitos homens saem da aldeia para a cidade não para competir e sim para serem reconhecidos. Temos representantes indígenas que são políticos como vereador, deputado. Agora é a mulher indígena que está saindo atrás de seus direitos, que vem buscar conhecimento. Isso está acontecendo lentamente porque é tudo muito novo, é muito difícil sair de uma cultura e entrar em outra diferente, até você se adaptar, ter o conhecimento do não indígena, tem um pouco mesmo de conflito. Mas temos essa capacidade de aprender e estar junto com os não indígenas.
É um choque para os índios sair de uma cultura totalmente diferente. Você está isolado com outros costumes, outras línguas e vai para uma cidade de pedra, sendo que morava na natureza, onde só tinha mato. Eu mesma, até os 12 anos, não falava português.
Um dos resultados dessa luta é que muitas crianças das escolas das aldeias estão aprendendo o português ao invés de apenas serem ensinadas a língua de seu povo. Sem contar a tecnologia que agora está entrando nas comunidades como internet, rádio e TV, que ajudam a ampliar o conhecimento, a visão de conquistar novos espaços, e então as crianças estão tendo mais facilidade de acompanhar e de se preparar.

- E o que está preparando e espera acontecer nas lutas que tem pela frente?
We’e’ena: Estamos preparando para 2013 o primeiro congresso das mulheres brasileiras indígenas, onde vamos convidar diferentes autoridades entre nossos povos e não indígenas também para falarmos sobre direitos e deveres. Esse ano vai ser de pequenos debates preparatórios para a preparação do congresso. Por isso, tenho viajado muito pelo país e fazendo o convite para as diferentes aldeias.

Fonte: Msn Mulher


O que é ser índio hoje?


No imaginário de muita gente o índio é aquele indivíduo que mora na floresta, vive apenas da caça, da pesca e algum tipo de coleta. Mas será mesmo essa a realidade indígena brasileira?

No Brasil, somos hoje em torno de 220 etnias indígenas, falantes de 180 línguas indígenas. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (censo 2010) a população indígena é estimada em 818 mil indivíduos, o que corresponde a 0,4% da população brasileira. No passado éramos muito mais. De acordo com o Professor Aryon Rodrigues em um artigo denominado “Línguas indígenas: 500 anos de descobertas e perdas”, publicado em 1993, éramos em torno de 5 milhõesfalantes de cerca de 1.200 línguas distintas.

Estou na cidade e Continuo sendo Índio

A maioria dos indígenas que vive nas cidades sofreram e sofrem discriminação e preconceito. Em muitos casos o discurso preconceituoso vem acompanhado do senso comum, “índios é o que vive na mata, que anda pelado, que não tem veículo automotivo…” enfim, esse fato foi d na cidade de Boa Vista através da Organização dos Indígenas da Cidade – ODIC, essa organização está lutando com unhas e dentes para barrar essa margem de preconceito.
O fato a questionar é : os indígenas vieram para a cidade? ou a cidade que chegou para os indígenas ? Por que assim, pois vejamos, a cidade está cercada pelas comunidades Indígenas e nela se encontram aproximadamente 30 mil indígenas. Muitos deles vindo de outros países vizinhos. Segundo o Professor Reginaldo Gomes de Oliveira, da Universidade Federal de Roraima, aqui onde é a atual Cidade de Boa Vista era uma Comunidade Indígena Macuxi, e o nome seria kuwai Krî, que quer dizer Terras de Buritizais. Essa mesma História, se repete nas reuniões da ODIC, e também nos discursos de alguns anciões de comunidades do Interior do Estado.
Então Boa Vista foi implantada em cima de uma Comunidade Indígena, e o melhor é uma Comunidade Indígena, e a maior do Estado. Pode ser dizer que a maior aldeia de Roraima é BOa Vista, sem pingo de dúvida. De acordo com a História do não-índio a cidade criou-se a partir de uma Fazenda, o que ao se questionado com alguns anciões de comunidades, eles afirmam que tinha sim uma fazenda, mais não a que se tornou Boa Vista.
O fato de eu está na cidade, usar celular, roupa, calçado, ir para a universidade, passear nas praças, não me tira a identidade indígenas, aliás eu na cidade estou apenas visitando parentes, o que significa que aqui na cidade eu me sinto como na minha comunidade, só que agora aqui é uma comunidade onde se tem vários Povos Indígenas e não Indígenas.

FONTE:  http://www.indioeduca.org