segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Autores de ação contra Lobato querem educação étnico-racial para professores



No Supremo, defensores de restrição ao livro Caçadas de Pedrinho vão propor mudanças curriculares nos cursos de formação de docentes para que obra seja liberada nas escolas

 Os autores da ação contra o uso do livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, nas escolas brasileiras, querem mudanças curriculares nos cursos que formam professores antes de as obras entrarem na rotina escolar das crianças. O investimento na formação inicial e continuada dos educadores em temas étnicos-raciais é o principal ponto da proposta de acordo, à qual o iG teve acesso, que será apresentada esta noite por eles ao Ministério da Educação. 







Às 19h30, representantes do Ministério da Educação, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), o professor Antônio Gomes da Costa Neto, que questionou a utilização do livro por conta de conteúdos racistas, e Humberto Adami, do Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara), co-autor da ação, participarão de audiência de conciliação no Supremo Tribunal Federal (STF).
O encontro inusitado foi marcado pelo ministro Luiz Fux, relator da ação no STF, em junho. Segundo ele, o tema traz “conflito em torno de preceitos normativos de magnitude constitucional, quais sejam, a liberdade de expressão e a vedação ao racismo” e, por isso, a negociação é a melhor saída para encontrar um “desfecho conciliatório célere e proveitoso para o interesse público e nacional”.
A ação apresentada por Antonio Costa Neto e o Iara pediam a suspensão da compra das obras ou a formação e capacitação dos educadores para utilizá-las de forma adequada, além da fixação de nota técnica nos livros. O conteúdo da proposta de conciliação que eles levarão hoje à audiência concentra-se na segunda parte do pedido: o uso do livro nas escolas desde que os educadores estejam preparados para lidar com temas relacionados ao racismo.
Neto conta que a proposta foi discutida em dois debates – um realizado pela organização não-governamental Educafro e outro pela seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil – e recebeu contribuições da sociedade civil. Foi apresentada previamente ao próprio MEC e ao ministro Luiz Fux. “Além disso, procuramos basear todas as nossas propostas nas leis e programas educacionais já existentes”, afirma.
Professores, o alvo
Divilgação
Clássico Caçadas de Pedrinho foi considerado racista por Conselho Nacional da Educação

Os autores da ação querem que o Ministério da Educação garanta recursos para aplicação da lei que inclui a educação étnico-racial dentro das escolas e também nas universidades. Para eles, é importante que, ainda na graduação, os futuros professores tenham uma disciplina obrigatória sobre o tema, que deveria ser incluída nas diretrizes curriculares nacionais para os cursos de pedagogia e licenciaturas de instituições públicas e privadas.
Com isso, a oferta obrigatória da disciplina faria parte do Sinaes, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior. É essa análise que garante às instituições a atividade de cursos e câmpus. As universidades precisam renovar as autorizações de funcionamento de tempos em tempos. Neto acredita que as instituições só obedeceriam a determinação de criar a disciplina caso ela recebesse pontos na avaliação.
O conteúdo de educação e cultura africana e afro-brasileira faria parte também do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade), de acordo com a proposta do Iara, nas avaliações das licenciaturas e graduações formadoras de professores. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes) também precisaria se envolver no controle, coordenação e avaliação da inclusão do tema nos cursos de graduação e pós. Além disso, as instituições precisariam garantir cursos de atualização e extensão para que os educadores continuassem a formação no tema após deixarem a faculdade.
“É importante deixar claro que a nota explicativa dos livros deve ser elaborada pelo MEC e não pela editora. Mas a nossa maior preocupação é com formação dos profissionais da educação. Essa formação hoje não existe nas universidades e, por isso, detalhamos tanto essa necessidade. Acredito que vamos sair com o melhor acordo possível dessa audiência, que é um ato raro e, na nossa opinião, um avanço para a conciliação”, diz.
Para Neto, é preciso garantir também, nesse acordo, um prazo máximo para aplicação das medidas – que ele sugere de dois anos – e a responsabilização de estores que não cumprirem as determinações.
A polêmica
Em outubro de 2010, o uso do livro de Monteiro Lobato se tornou o centro de uma polêmica sobre as obras literárias que poderiam fazer parte do cotidiano das crianças brasileiras. O Conselho Nacional de Educação (CNE) publicou um parecer recomendando que os professores tivessem preparo para explicar aos alunos o contexto histórico em que foi produzido, por considerarem que há trechos racistas na história.
A primeira recomendação dos conselheiros (parecer nº 15/2010) era para não distribuir o livro nas escolas. Escritores, professores e fãs saíram em defesa de Monteiro Lobato . Com a polêmica acirrada em torno do tema, o ministro da Educação à época, Fernando Haddad, não aprovou o parecer e o devolveu ao CNE , que então mudou o documento, recomendando que uma nota explicativa – sobre o conteúdo racista de trechos da obra – fizesse parte dos livros.

Leia a proposta de conciliação que será apresentada ao STF  



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